Notícia

'É a hora da reciprocidade do PT', declara Alice Portugal

17 novembro, 2015

No sexto mandato como deputada, o quarto na Câmara Federal, Alice Portugal é a pré-candidata do PCdoB para disputar a Prefeitura de Salvador em 2016. A comunista ressalta que o partido é o principal aliado dos governos petistas, na Bahia e nacionalmente, e entende que é o momento de os petistas cederem lugar para a sua candidatura. Alice lembra que foi também pré-candidata em 2012, quando foi eleito o prefeito ACM Neto (DEM), mas desistiu por não ter apoio. A deputada também deu o tom de como deve ser o embate contra o democrata: apontar que a atual administração não privilegia o campo social.
 
Na oposição, a senhora é a primeira pré-candidata definida. O que move a senhora a querer ser prefeita de Salvador?
Na verdade, é uma vontade partidária. O PCdoB, há muitos anos, participa da vida democrática, da vida institucional do Brasil e tem sido um fiel companheiro das mudanças. Um partido, a partir de seu amadurecimento, precisa participar de maneira real e nominal dos processos políticos e eleitorais. Assim sendo, o PCdoB quer lançar pelo menos 100 candidaturas a prefeito na Bahia e nas cidades de médio e grande porte no país afora. Nas eleições passadas, até ensaiamos, mas o partido avaliou que, sem alianças, não teria estrutura suficiente para encarar uma campanha e refluiu. Foi um refluxo sentido para mim, pois eu estava preparada para aquele momento e agora novamente, por eu ser a mais votada da cidade, do nosso partido. Meu nome foi levantado e aprovado na conferência do PCdoB na semana passada. Agora, serei candidata? Não sei. Estamos construindo ainda a candidatura.
Sempre o PT era quem encabeçava as candidaturas na oposição. A decisão do PCdoB está vinculada à decisão do PT?
Alianças são vasos comunicantes, são o estabelecimento de pontes entre forças políticas. Nós sempre consideraremos os aliados, os seus movimentos, os seus gestos. Evidentemente não ficaremos à espera, especialmente agora no caso do PT. Temos sido fiéis companheiros na história de mudanças no Brasil, apoiamos lealmente as candidaturas de Lula e Dilma e temos enfrentado esta avalanche de um consórcio oposicionista que se organizou no País. A nossa compreensão é que a defesa desse projeto democrático e popular de centro-esquerda, como são os governos de coalizão, a defesa inclui a alternância de protagonismo. Então compreendemos que, neste momento em que o PT passa por dificuldades objetivas, seria a hora de gesto para com o seu aliado principal, que somos nós. Então espero de fato uma análise do PT no sentido de apoiar a candidatura do PCdoB, apoiar dessa vez o meu nome, o nome de uma mulher que nunca teve oportunidade de ser candidata. Eu sou deputada pela sexta vez, e seria a hora do gesto do PT, uma vez que apoiamos Pelegrino e Pinheiro; seria a hora de testar o aliado. O PT será sempre maior que o PCdoB em qualquer governo em que estivermos juntos, porque ele é maior. Mas achamos que é a hora da reciprocidade do PT.
Haverá entretanto menor tempo para campanha, para propaganda de rádio e TV. Ou seja, é um menor tempo para convencer a população…
Nós do PCdoB, e eu com a minha experiência de campanha, temos uma clareza de que campanhas como a nossa, do campo popular, têm que ser feita com muita criatividade porque o dinheiro é muito pouco; nós temos dificuldades, principalmente as mulheres, e as estatísticas mostram isso, que temos muita dificuldade em receber doadores de campanha. Com a minirreforma eleitoral, as doações não poderão ser empresariais e o tempo muito menor. Então vamos trabalhar, otimizando esse tempo. Se a candidatura de fato firmar-se, vamos otimizar o tempo com muito corpo-a-corpo, muita ida na realidade concreta da vida do povo; nos locais de trabalho, de moradia, de estudo, nas feiras. Circularemos a cidade fazendo o que eu sei fazer. Corpo-a-corpo, olho no olho e o debate em alto nível.
O embate com o DEM foi antecipado. Peças de publicidade do PCdoB foram suspensas pela justiça eleitoral. Umas das acusações feitas pelo PCdoB é a de que o prefeito ACM Neto entregou a cidade a grupos que sempre a exploraram. O debate na campanha será na mesma linha?
O debate será leal, mas evidentemente firme. Não posso admitir que, em primeiro lugar, se aplique a lei da mordaça. E o prefeito, no primeiro incômodo, resolveu acionar a sua metralhadora jurídica para atingir um partido pequeno, que está dando opiniões sérias sobre a cidade. Nós não o atingimos pessoalmente, não houve ação difamatória ou caluniosa, mas o apontar de uma situação por que passa nossa cidade.
Mas é fácil gerir Salvador?
Não seria leviana em dizer que vivemos numa cidade fácil. Salvador não é uma cidade fácil, mas uma cidade que tem um histórico de beleza e de problemas, que são enormes. Mas o foco do prefeito não é o social, tanto que foram festas e festas, Carnaval prolongado, réveillon estrelado, mas 26 pessoas morreram com a dissolução de encostas. Todo mundo sabe que Salvador não é 365 dias de sol, tem inverno molhado, chove muito. Por isso a nossa atitude é mostrar o acontecimento, da falta do foco no social. Fizemos isso em nossas inserções, sem nenhum tipo de aleivosia. Felizmente o tribunal acatou nosso recurso, e a propaganda continua a fluir. Temos experiência enorme de enfrentar o arbítrio, e isso nos deu um handicap (vantagem) para enfrentar o neto do imperador. A gestão atual remonta às mesmas fórmulas do tradicional carlismo na Bahia; eles se valem da técnica, têm técnicos experientes, mas o foco é o do mercado imobiliário, da maior tributação possível – o prefeito fez um aumento do IPTU de forma disforme; não foi uma busca de quem tem mais pague mais, de que tem menos pague menos. A cidade de Salvador sempre foi marcada pela interpolação das classes sociais, das etnias; então em um mesmo bairro pode ter moradias de padrão de classe média e moradias muito pobres.
Mas o prefeito ACM Neto é muito bem avaliado, e as pesquisas mostram isso. Será um desafio ainda maior vencê-lo com a metade do tempo de campanha?
De fato, é ele quem está na máquina e tem ao seu lado um consórcio midiático. Evidentemente que é uma batalha desigual, pois não tenho sobrenome, nem a herança, nem o tempo de TV e nenhum dos recursos. Mas nada disso nos atemoriza, porque se fôssemos nos lastrear nas pesquisas não se teria levado adiante a candidatura de Jaques Wagner e Rui Costa. As pesquisas mostram um momento. E ainda temos um tempo até a eleição, para mostrar o trabalho que está sendo feito pelo governo do estado aqui em Salvador, no Centro Histórico; em relação à mobilidade urbana, como vimos hoje (sexta, 13/11) na inauguração do metrô, das avenidas que cortam a cidade. Daqui até lá, faremos esse debate e não deixaremos que ele se afunile apenas para o momento da campanha.
Mas há a questão do governo federal. Como defender o governo diante de todas as denúncias e escândalos de corrupção? Vocês tentarão dissociar-se disso?
Os governos de Lula e de Dilma foram os governos que trouxeram as maiores vitórias sociais da história do povo brasileiro. Foram os governos que deram voz e vez aos que vieram de baixo, aos pobres, aos negros, às mulheres. Vamos pegar o setor que é a minha origem: aqui na Bahia saímos de uma para seis universidades. Um jovem sem recursos pode fazer o Ciência sem Fronteiras e acabou o funil do vestibular, quando eram apenas três mil vagas. Então esses são os melhores governos da república. Mas por que os governos de Fernando Henrique, que foram dois, não tomaram iniciativas como esta, com essa filosofia e essa característica. Mesmo governo anteriores como o de Fernando Collor de Melo ou de transição democrática de José Sarney, por que que não rumaram nesta direção? Porque, evidentemente, há uma modelagem político-ideológia que define esse período. Então o PCdoB não tem dificuldade para defender esse projeto.
Mas e a corrupção?
Quanto às pessoas que se envolveram em corrupção, há um ditado muito sábio usado aqui em Salvador: “Se tem água suja na bacia, jogue a água suja fora, mas não jogue a criança junto”. Então a Polícia Federal livre, o Ministério Público independente, essas instituições foram fortalecidas durante nossos governos. Então quem tiver máculas éticas de fato, se tiver fugido às boas práticas em relação à coisa pública, têm que responder por isso. Então defenderei com toda tranquilidade o projeto, mas também defenderei que, com direito de defesa e com igualdade de análise, todos os que tiverem que responder na justiça, respondam.
Hoje há uma rejeição à presidente Dilma e ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Mas o PT diz que quer esperar a decisão do conselho de ética em relação a Cunha. E o PCdoB? Como justificar esse jogo de “não ataque” entre o PT e Cunha: um que não quer o impeachment da presidente; e Cunha que não quer perder o mandato?
O PCdoB tem uma opinião clara. O presidente da Câmara já não reúne as condições para permanecer como presidente da Casa, pois ele está acumulando fatos que lhe tiram a condição de presidir a Casa. Segundo, nós temos que aguardar de fato a conformação de um processo. Nós tivemos a bancada de 1946 do Partido Comunista cassada sem processo. Nós não temos relação com o presidente, não o apoiamos, portanto temos liberdade de ação. A relação disso com a proposta de impeachment foi construída numa trama malévola. A tentativa de aprovar um requerimento de impeachment no plenário da Câmara é golpista, pois não há nenhum tipo de justificativa para imposição de impedimento para a presidenta. Juristas renomados como Heleno Torres, da USP, têm deixado claro que esta compensação para o equilíbrio fiscal entre governo e bancos públicos não significou empréstimos nem nada que significasse uma pedalada para finalidades escusas.
Mas o ministro do TCU Augusto Nardes teve uma interpretação contrária…
Nardes é um voto político. Ele veio aqui para a Bahia, para uma praia, reuniu-se com seus correligionários e deu um voto político.
Mas foi aprovado por todo o plenário do TCU…
Mas podemos fazer uma análise, nome a nome, do plenário do TCU. O problema é que, de fato, a questão política contaminou o voto, e a questão técnica foi abandonada.
 
*Publicado no jornal A Tarde em 16/11/2015
 

PCdoB - Partido Comunista do Brasil - Todos os direitos reservados